deletei

Hoje apaguei mais de 800 e-mails do meu outlook, 822 para ser exata. Tinha coisa lá que eu nem lembrava mais, de mais de cinco anos. Respostas para amiga que mandava notícias do navio, histórias saudosas do primo italiano, pedidos para o advogado finalizar o distrato da lojinha, informações do casal que me ajudou a superar a perda de uma amizade com a oportunidade de ler para crianças em necessidade, enfim, tinha tanta coisa lá, mas bastou dois únicos cliques para deixar tudo onde pertence: no passado. Que sou apegada ao que aconteceu ontem todo mundo sabe, que acho que ontem era melhor que hoje e será sempre melhor que amanhã também, mas de repente é chegada a hora de colocar as coisas em seus devidos lugares e simplesmente aceitar que a vida é o hoje. Não são as aventuras italianas, as festas na caverninha, os almoços de domingo na casa da professora de natação ou as noites ouvindo música na penumbra da sala da amiga. Não são as terças, as quartas, as quintas de nomes engraçados que eram simples desculpas para fofocar com os amigos, não são as confrarias de segunda-feira, não é aquele churrasco de 30 anos, nem a festa surpresa das bodas de prata dos pais ou as bodas de ouro dos avós. Não é o e-mail de aniversário para a irmã, que sempre comemora a data longe. Não são os dados para as viagens internacionais de trabalho, nem os releases da galera. Tudo isso passou. Deixou aprendizado e saudade, mas passou. Hoje é o que interessa. Porque se continuar vivendo lá, o aqui nunca fará sentido. Claro que vou carregar minhas recordações no peito e na mente para lembrar quem fui - e sou -, mas já não preciso guardar tais lembranças fisicamente. Isso só me traz sofrimento e tudo o que preciso agora é seguir em frente com o mínimo de dor possível. Ela disse que hoje já não nos é permitido refletir sobre nossas dores, senti-las até não poder mais antes de continuar. A rapidez do mundo nos impede. Em parte é verdade, porque temos que fingir que o que aconteceu faz parte da vida e levar o dia normalmente. Mas por dentro, cada um sabe a dor que carrega e o tempo que leva para curar, se é que a gente cura mesmo. Depois de 11 anos de jornalismo em Londrina e de algumas perdas irreparáveis na nossa redação, ontem foi dia de mais um corte. Um corte lento, duro, tão dolorido como os outros ou mais, porque há tempos não perdíamos tanta gente competente. E amigos. Não sei se dói mais perder o jornalista ou o amigo. Acho que as dores se confundem porque sofre quem sai e sofre quem fica: pelo desemprego, pela saudade, pelo trabalho acumulado. E até de medo em esperar a nossa hora. Porque ela inevitavelmente vai chegar e puxar o tapete sob nossos pés. Nessas horas eu sempre desejo a sinceridade. Demitir alguém é uma função terrível e nem sempre se tem palavras para justificar o ato que muitas vezes nem é escolha de quem comunica. Mas aprendo que essa responsabilidade também vem com a vida adulta. Triste com o último ano, que pesou mais que uma tonelada sobre nós, desabafei com quem amo e recebi a mesma resposta: agradeça. Pois ai vai, então, obrigada por tudo, de bom e ruim. Que isso tudo me fortaleça e me ensine a ser mais leve. Para encarar que coisas ruins acontecem, independentemente da nossa vontade. E que é preciso olhar com carinho para a vida e tentar encontrar beleza até nos momentos tristes - só assim alcançamos tranquilidade.

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