sobre números

"O amor só dura dois anos." Esta frase da amiga - que tem um contexto que não cabe aqui - me fez pensar sobre os números da vida. Para mim, os números começam com a idade. A gente passa nove meses na barriga da mãe, vem ao mundo, e é visitado por um monte de gente nos primeiros meses, quando os dentes doem para nascer e sorrimos por qualquer bobagem. Quando completa um ano - com aquela tremenda festa que só faz sentido para os adultos - aprende a andar, e ganha uma certa independência. Dai para frente são conquistas diárias: a primeira palavra, os terríveis dois anos, a primeira aula na escolinha e assim vai. Minha vida começou a mudar aos três anos quando chegou a irmã mais nova. Não seria mais única. Mas acho que isso nunca me incomodou. Pelo menos é o que minha mãe diz. Claro que sinto ciúmes, mas estou mais controlada. Acho que sinto mais falta dela ao meu lado do que ciúme, mas são sentimentos que a vida nos ensina a equilibrar. Mas falando em números, aos sete eu comecei a arrumar a mesa e enxugar a louça para minha mãe, aos dez, comprava pão na padaria e contava o troco certinho, aos 12 atravessava a rua para ir buscar qualquer coisa no mercado para a mãe ou ia no bazar comprar papel de carta. Aos 13 participei da minha primeira festinha adolescente na casa da amiga. Aos 14 mudei de escola e tudo mudou na minha vida de novo. Precisei fazer novos amigos e contei com o apoio da minha mãe, que pegou na minha mão no primeiro dia de aula e me fez sentir menos apavorada. Deu certo. Foi a melhor escolha que meus pais poderiam ter feito por mim. Três anos depois minha irmã tomaria o mesmo rumo e também teria sua vida transformada pela dupla Zé-Julinho. Que saudade de ser exata. Na faculdade, minha mãe, de novo, precisou pegar na minha mão. É, sou medrosa. Foram quatro anos quietos, sem baladas e churrascos, como todo universitário faz. Sempre fui muito tímida e festas cheias de gente sempre me apavoraram. Mas aos 19 anos, no meu segundo estágio, conheci um grupo de futuros jornalistas fantástico. E criamos uma família, que tinha a mãe e um bando de filhos, um mais diferente que o outro, como em toda família que se preze. Lá conheci meu primeiro – e único – namorado (é tenho problemas, eu sei). A paixão não vingou mas a amizade permanece – de longe. Sinto saudade das nossas conversas profundas sobre a vida e dos seus versos. Aos 21 subi num avião pela segunda vez na vida e viajei sozinha por 12 horas para chegar ao meu sonho italiano. Foram apenas quatro meses. Mas quatro meses transformadores. Lá conheci o primo mais maluco e querido e um bando de estrangeiros que me ensinaram – cada um do seu jeito – a ser como sou hoje. Aos 22, me tornei jornalista de verdade. Cresci na profissão dentro do segundo maior jornal do estado. Perdi (em parte) o medo de conversar com o outro e hoje tenho muitos amigos queridos que gostam de mim exatamente como sou – dramática pacas. Tive tantos amores platônicos que até perdi a conta e depois de muito errar, escolhi deixar meu coração livre para o que der e vier. Morei com a prima preferida, a vi casar, tornar-se mãe, vi a prima caçula se formar, vi a irmã tornar-se mestre e se apaixonar, vi o pai se aposentar e recomeçar. Iniciei eu mesma um esboço de recomeço em uma nova faculdade. Vi o avô morrer e a transformar nossa vida tudo de novo, fazendo mãe e vó serem uma pessoa só. Aprendi sobre saudade. Aprendi muito mais do que estava preparada para aprender e sofri. A minha vida não tem nada a ver com o que sonhei para ela, mas sem sombra de dúvidas estou onde deveria estar. Conquistei tanto – mas tanto – que tenho dificuldade em acreditar. Por isso, minha promessa para esses 34 é aceitar. A mim, o outro, que é possível superar o que vier.
E ter a certeza de que o amor dura muito mais que singelos dois anos.

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