realidade x ficção

Ontem todo mundo foi até a casa da minha mãe ver a vó. Ela caiu da cama, machucou o peito e sentiu-se mal. Precisou de umas boas horas no hospital do novo convênio para descobrir que está bem. Só precisa se alimentar melhor. Tomou soro com vitamina B12 para dar uma arribada, como se diz. Chegou na casa da filha abatida, dolorida e reclamando como sempre. Mas comeu um prato de sopa e tomou um banho antes de vestir a camisola lilás e deitar na cama que um dia foi da segunda neta e agora será dela. Ai o pessoal começou a chegar para visitá-la. Primeiro meu pai, que chegou com uma sacola de remédios, entre eles pomada para as dores da sogra. Depois chegaram meu tio com a esposa e as duas filhas. Eles acabavam de voltar das férias na praia. Um bom tempo depois chegaram meu primo e a namorada, que subiram na moto depois da aula de salsa só para ver a vó. Minha irmã estava na praia e usou o aplicativo de vídeo para pedir para a vó se comportar. Minha outra tia ligou mais tarde para saber da mãe. E assim foi nosso réveillon particular, na primeira segunda-feira de 2019. Esse ano cada um passou de um lado e foi a primeira vez que nos vimos. Acabou em pizza. Até a vó comeu um pedaço e tomou coca-cola. Ficou conversando e contando uma história diferente para cada um, de como tinha caído da cama naquela manhã. O peito roxo denunciava que outro acidente havia acontecido mas as informações desencontradas nos deixaram mais confusos sobre o que é realidade e o que é ficção. Minha mãe estava abatida e cansada depois de um dia aflito de hospital. Ligou para a melhor amiga avisando que desculpasse mas não tinha cabeça para ir ao aniversário do marido dela, um de seus melhores amigos. Ficou cuidando da vó e lamentando ter batido o carro enquanto se dirigia até o apartamento da mãe para buscá-la naquela manhã, depois de ouvir pelo telefone que ela tinha caído da cama. Acho que a imagem que imediatamente lhe veio à cabeça foi da mãe estatelada no chão, gemendo de dor, sem conseguir levantar e ligar para alguém acudi-la. Já eu acho que foi só um escorregão e que ela levantou sim, tomou café da manhã e atendeu prontamente o telefone quando a filha ligou e só na hora do telefonema decidiu contar do incidente. Ninguém nunca saberá exatamente o que aconteceu. O que se passa na mente dos idosos é uma fantasia só deles e quando moram sozinhos fica ainda mais difícil acreditar nas ideias malucas que eles são capazes de combinar. Como resultado deste jogo que batizo de realidade x ficção, ficam as horas em que nos reunimos na sala da casa da minha mãe, confabulando sobre o que é melhor para a nossa criança de 86 anos a partir de agora. São as risadas com a vó contando o que aconteceu. É todo mundo se desejando feliz ano novo e celebrando que ainda está tudo bem em volta da mesa para comer a pizza que custou metade do preço na promoção de segunda-feira. A coca-cola estava quente, mas a vó também. Sinal de vida. Fui dormir sem sono porque precisava levantar cedo para pegar o voo de volta para casa. Meu ano começa hoje. Que seja o que tiver que ser. E como diz o personagem da série judaica que maratonei com os pais no fim de semana: "Tudo na vida tem a hora certa para acontecer, graças a Deus".

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