querido diário
Eu queria ter coragem de te dizer algumas verdades. Mas seriam as minhas verdades não as suas. Não faria diferença para você. Tanto quanto o que você me diz, que sempre muda meu jeito de me ver e de ver o mundo. Eu sempre aprendo. Mas sinto que posso ensinar também, se você deixar. Então eu durmo até tarde para não precisar encarar a realidade de uma rotina focada no trabalho. Faz bem porque eu descanso o corpo, mas a mente segue trabalhando. E resolvendo no sonho o que não tem coragem de resolver na realidade. Ou talvez não seja falta de coragem, seja falta de vontade de encarar que já deu. Porque o conforto grita mais alto que a autoestima nesse caso. Para escapar, decidi ver a nova série adolescente e pensei: que bela metáfora para explicar a ansiedade que corroe alguns desde a juventude. E acompanha outros pelo resto dos dias. Explodir tudo quando não aguentamos poderia ser uma saída para aguentar o barulho interno. Mas dai a alternativa proposta pela personagem adulta é escrever, olha só. Escrever um diário ainda por cima. Que grande piada, pensei. Mas não é exatamente o que fiz desde que percebi que não aguentava algumas coisas e que elas precisavam sair de algum jeito? Há muitos anos. Desde a primeira espinha na cara. Desde a primeira briga com a mãe. Desde a primeira vez que gostei de um menino. Desde que vi aquele magrelo pela janela. Desde que beijei aquele desconhecido no shopping. Desde que contei pro magrelo que gostava dele. Desde todas as cartas que troquei com a prima. Desde todos os bilhetes trocados com as amigas para aplacar o tédio das aulas. Desde a última carta escrita, de amor, dia desses. Eu sempre escrevi. Até sobrevivi por conta da escrita por um tempo. Se não pude explodir o mundo, escrevi sobre ele. Escrevo para não explodir. Eu poderia te dizer algumas verdades e te dizer que você continua o máximo mesmo sendo imperfeita. Mas você nunca iria entender. Quer dizer, você sabe disso e não precisa que te digam. Eu só preciso que me ouçam, às vezes. Nem sempre a escrita faz o serviço sozinha. Seguimos no dilema, então.
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